“Acontece, entretanto, que nascemos para o encontro com o outro, e não o seu domínio. Encontrá-lo é perdê-lo, é contemplá-lo na sua libérrima existência, é respeitá-lo e amá-lo na sua total e gratuita inutilidade.” Hélio Pellegrino
Schopenhauer ilustrou com a parábola do porco-espinho o nosso dilema diante do laço social. Quanto devemos nos manter perto do outro para nos aquecermos e quanto devemos nos manter longe para não nos ferirmos? Esse é um conflito permanente e sem resposta certa ou definitiva. Ninguém nos ensina essa medida; e sequer existe uma que seja universal, precisa ou garantida.
Me coloco diante dessa questão não só nas relações sociais, mas também no amor, contradizendo e duelando com os princípios universais que essa palavra evoca. Ao dirigirmos ao outro o nosso amor, trazemos no reboque nossa demanda de sermos amados, e mais: de permanecermos próximos. Mas o que é isso para um e para o outro?
Tem gente que deseja a fusão, tem gente pra quem a demanda amorosa é um fardo, tem gente que se defende, outros ainda “nem que bebessem o mar encheriam o que têm de fundo”, como canta Djavan. Tem gente pra tudo que é gosto, mas é impossível que os gostos se combinem, se completem, se encaixem.
É nesse desencontro de expectativas que moramos em cada impasse amoroso. E quem é que tem razão? Como resolvemos a ameaça de sermos devorados pelo amor, ou ao contrário, de suportar o que desejamos, quando somos frustrados pelo outro?
Será que amar nos coloca em desvantagem?
Freud alertou sobre o sofrimento que o amor implica, com a ressalva que não amar nos adoece. Sofrer e adoecer são, então, coisas distintas. É bom não confundirmos.
Cada amor é um encontro marcado, a ferro e fogo. Deixa marcas e lições, memórias, dores e descompassos. Mas, pra se realizar, é preciso existir na lacuna, na fenda, na rachadura dessa marca que lateja.
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